Três ideias, em uma frase cada
- Oralismo: prioriza fala, treino auditivo e leitura labial; historicamente, muitas escolas excluíram a língua de sinais após o Congresso de Milão (1880).
- Comunicação Total: filosofia multimodal: usa todos os recursos que funcionarem (Libras, fala, escrita, gestos, figuras, tecnologias), sem obrigar falar e sinalizar ao mesmo tempo.
- Educação Bilíngue (Libras–Português): reconhece Libras como L1 e português (preferencialmente escrito) como L2, com diretrizes específicas no Brasil.
O que muda na prática
Se a escola disser “aqui a gente só treina a fala…”
Você está olhando para uma abordagem oralista. Ela pode ser útil para quem deseja treinar produção de fala e leitura labial, mas não substitui o direito à Libras e a recursos de acessibilidade.
Se a proposta for “cada um usa o que ajuda mais, combinando recursos…”
Isso é Comunicação Total — um guarda-chuva de acessibilidade que acolhe Libras, fala, escrita, legendas e intérprete. O ponto-chave é personalizar, não empilhar tudo ao mesmo tempo.
Se as aulas são em Libras, com português ensinado como L2…
É Educação Bilíngue: docentes fluentes em Libras (preferencialmente pessoas surdas), materiais em Libras e português escrito trabalhado como segunda língua. É a via mais alinhada aos marcos legais atuais.
Forças e limites (do jeito direto)
Oralismo
- Pode ajudar: treino de fala para quem quer/precisa; leitura labial em situações sem intérprete.
- Limites frequentes: carga cognitiva alta da leitura labial, perda de informação, risco de apagar Libras e cultura surda quando imposto como único caminho (herança do Milão/1880).
Comunicação Total
- Pode ajudar: turmas mistas, eventos e serviços em que combinar canais dá mais acesso.
- Cuidado: não confunda com “falar e sinalizar sempre simultaneamente”. Essa simultaneidade costuma sacrificar a Libras (vira “português sinalizado”, que não é Libras).
Educação Bilíngue (Libras–Português)
- Pode ajudar: construção de base linguística sólida (L1 visual) e aprendizagem do português como L2 com melhores resultados de leitura e escrita.
- Exige: equipe formada, materiais e gestão alinhada à legislação (Lei 10.436/2002, Decreto 5.626/2005 e marcos posteriores).
Erros comuns que atrapalham (e como corrigir)
-
“Se aprender Libras, não vai falar.”
Correção: uma língua não atrapalha a outra. O ensino bilíngue trabalha L1 e L2 com funções diferentes. -
Achar que leitura labial basta.
Correção: ofereça intérprete de Libras, legendas, materiais visuais e boa iluminação — principalmente em ambientes barulhentos. -
Confundir Comunicação Total com “falar+sinalizar sempre”.
Correção: escolha o melhor canal por situação; evite simultaneidade que deturpa a gramática da Libras. -
Tratar português como L1 da pessoa surda por padrão.
Correção: em bilíngue, Libras é L1 e o português é L2 (ênfase na modalidade escrita).
Checklist rápido para escolas, eventos e serviços
- Língua de instrução/atendimento: disponibilize Libras (docentes e/ou intérprete) e português escrito acessível.
- Materiais de apoio: slides com palavras-chave, legendagem quando possível, QR com resumo.
- Ambiente físico: iluminação frontal para quem usa leitura labial; distância e ângulo de visão adequados.
- Tecnologia: apps de transcrição ao vivo, vídeo remoto de intérprete, plataformas que suportem Libras.
- Preferência linguística: pergunte antes. Comunicação Total significa personalizar, não padronizar.
Mini-exercícios para grupos de estudo (estilo Cantinho)
- Pegue um aviso e produza duas versões: (1) em Libras, (2) em português claro; liste os apoios extras que usaria ao apresentar.
- Assista a um vídeo com fala+sinais e anote quais sinais foram “comidos” — entenda por que isso não é Libras plena.
- Em uma reunião, experimente três modos de acesso: intérprete, legendas e resumo escrito. Compare fadiga e compreensão.
Conclusão
Não existe “uma receita” que sirva para todas as pessoas surdas — existe direito linguístico, existe escolha e existem bons recursos. Para aprender, trabalhar e conviver com qualidade no Brasil, o caminho mais sólido é oferecer Libras com protagonismo e português como L2, combinando apoios práticos quando necessário. Isso não exclui treinos de fala para quem desejar; inclui o que realmente dá acesso.
Referências e links (para saber mais)
- Lei 10.436/2002 (reconhece a Libras): https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10436.htm
- Decreto 5.626/2005 (regulamenta a Lei da Libras): https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/d5626.htm
- Lei 14.191/2021 (educação bilíngue de surdos na LDB): https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14191.htm
- MEC (2025) – formação em educação bilíngue de surdos: https://www.gov.br/mec/pt-br/assuntos/noticias/2025/fevereiro/mec-lanca-formacao-em-educacao-bilingue-de-surdos
- MEC (2025) – balanço de iniciativas em educação bilíngue: https://www.gov.br/mec/pt-br/assuntos/noticias/2025/setembro/iniciativas-do-mec-fortalecem-a-educacao-da-comunidade-surda
- Comunicação Total – origem (Roy Holcomb) em publicações acadêmicas:
• Revista do INES: https://seer.ines.gov.br/index.php/revista-arqueiro/issue/view/132/86
• Artigo (Redalyc/Editorarealize): https://editorarealize.com.br/editora/anais/cintedi/2020/TRABALHO_EV137_MD1_SA7_ID821_21082020233839.pdf - Congresso de Milão (1880) – contexto histórico:
• Artigo SciELO (2022): https://www.scielo.br/j/rbhe/a/k8sQykZnrVFXvtZPfsWk3Dy/?lang=pt
• Deaf History Europe (síntese): https://deafhistory.eu/index.php/component/zoo/item/1880
Texto e imagem produzidos com inteligência artificial. Autor responsável: José Eduardo Thomé de Saboya Oliveira.





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