quinta-feira, 14 de junho de 2018

Eleita para ONU, deputada brasileira com deficiência critica cortes de Temer


14.jun.2018 às 17h26

Na sede da ONU, Mara, que é tetraplégica em decorrência de um acidente automobilístico Foto: DivulgaçãoEm seu segundo mandato como deputada federal pelo PSDB-SP e de olho numa vaga ao Senado por São Paulo, Mara Gabrilli, 50, foi eleita nesta semana, em Nova York, para compor o comitê das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

É a primeira brasileira na história a conseguir o cargo que, para a gestão que começa no ano que vem e vai até 2022, foi uma das mais concorridas da ONU, com 35 postulantes. Ela conquistou 85 votos.

Mara falou em primeira mão ao blog após a votação. Fez críticas ao governo Temer por cortes nos orçamentos dos esportes olímpicos e paraolímpicos, falou dos desafios que enfrentará na função e como pretende estimular o país a organizar cobranças e denúncias pelo respeito à diversidade


1 – O que muda nas vidas pessoas comuns ter você como representante na ONU?

Antes de tudo, é importante dizer que essa eleição significa uma grande vitória para o Brasil, que através dos movimentos sociais, lutou muito para que essa Convenção (Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência) fosse aprovada.

Fomos um dos primeiros países a ratificar a convenção e um dos poucos do mundo que a incorporaram à legislação interna do país. Participar de discussões do âmbito das Nações Unidas nos permite ter acesso a informações e a uma nova agenda que impacta na própria agenda de políticas públicas do Brasil.

Hoje, por exemplo, um dia após minha eleição (no dia12/06), me reuni com a Daniela Bas, Diretora de Desenvolvimento Econômico e Social da ONU, com quem falei sobre a importância do esporte para a construção da paz e do desenvolvimento, um lema fortemente defendido pela ONU.

Coincidentemente, hoje também, tive a notícia de uma Medida Provisória do governo que retira verba do esporte olímpico e paraolímpico, destinando para a segurança. É uma medida que vai à contramão de tudo que está sendo discutido em todo o mundo.

O esporte é uma forma de prevenção à violência e, talvez, se investíssemos mais no esporte, não estaríamos com índices tão altos de violência no país. Estar incluída nessa agenda internacional vai nos permitir trazer novas ideias ao país, não só para pessoas com deficiência, mas para todos os públicos.

2 – A sua eleição foi bem disputada. O mundo está mais de olho nas questões que envolvem diversidade, pessoas com deficiência?

Foi a eleição mais difícil da história do sistema das Nações Unidas, por conta do número de países que apresentaram candidaturas. Em determinado momento, esse número chegou a 35 e isso nunca havia acontecido.

Depois, aos poucos, alguns países retiraram as candidaturas, permanecendo 22 na disputa. Acho que esse número de candidaturas apresentadas para um comitê temático na pessoa com deficiência mostra que o mundo está de olho nesse tema, de olho nas questões relacionadas à acessibilidade.

Vivemos um momento de foco não apenas na diversidade, mas especialmente de foco na causa, e isso acontece no mundo inteiro, que começa a perceber que a política pública para a pessoa com deficiência é uma política pública para todos. Quando uma cidade fica melhor para quem tem deficiência, ela fica melhor para toda e qualquer pessoa.

3 – Sua eleição foi feito inédito pelo país, tem alguma plataforma específica que pretende defender?

Fui eleita apresentando oito propostas de trabalho, das quais destaco uma que é fruto das demandas que recebo diariamente em meu gabinete, como deputada: trabalhar pela celebração de acordos bilaterais e multilaterais para a desoneração tributária de tecnologias assistivas.

No Brasil, por exemplo, o custo de uma tecnologia assistiva ainda é muito alto, e muito por conta da alta taxa de impostos. Outra proposta é desenvolver estratégias que oportunizem, estimulem e fortaleçam o monitoramento independente da convenção pela sociedade civil.

Quero trabalhar também pela reabilitação, que é precária ou inexistente em muitos países do mundo. São demandas que nos chegam através da própria sociedade civil.

O mandato de Mara Gabrilli começa no ano que vem e vai até 2022 Foto: Divulgação4 – De que maneira você espera ver refletida sua posição, agora mundial, dentro dos atrasos inclusivos do Brasil?

Sou representante da sociedade no parlamento brasileiro, sou tetraplégica – uma deficiência considerada severa – e antes de entrar para a política, já era militante da área.

De certa forma, minha presença no comitê vai expor o Brasil. Como brasileira e membro do comitê, não poderei monitorar o Brasil, mas algum outro membro o fará, e o fará com olhos clínicos, por termos um representante no Comitê.

Minha presença ali faz com que o próprio país tenha que se preparar melhor, se mobilizar para não passar vergonha. Minha responsabilidade aumenta, assim como minha formas de atuação para lutar pelos direitos das pessoas com deficiência.

E como membro de um comitê expert e independente na temática, a partir do ano que vem, quando começará meu mandato, terei o dever de informar e orientar a sociedade civil nacional sobre os papéis do comitê, os caminhos para se fazer denúncias coletivas e individuais e os mecanismos de promoção, implementação e monitoramento da convenção.

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