terça-feira, 20 de setembro de 2011

Entrevista; FLÁVIO CALDEIRA

“Se a lei só existir no papel,
é uma questão jurídica
e burocrática, a lei tem que ser
posta em prática,
tem que estar nas ruas
e na sociedade,
é uma questão
de educação também.”
Através desta matéria, publicada originalmente no blog DeficienteCiente,  você vai conhecer a história do paulistano Flávinho Caldeira, mestre em fazer fotomontagens que são publicadas no Facebook, para a diversão das pessoas com e sem deficiência..

"Se você parar em qualquer grande avenida de São Paulo e esperar para ver esse táxi “fantasma” adaptado, vai criar raízes no lugar onde parou… Foi mal planejado, mal aplicado, mal difundido e mal fiscalizado.”

Como você se tornou uma pessoa com deficiência?

Foi em um acidente automobilístico, voltando de uma viagem de trabalho. Estava voltando de Goiás para São Paulo de ônibus e na última parte da viagem, entre Ribeirão Preto e Cravinhos, o motorista dormiu ao volante e ocasionou um grave acidente com capotamento do veículo, deixando seis mortos, muitos feridos e infelizmente eu fui o ferido mais grave me tornando tetraplégico!

Como foi sua adaptação nessa nova vida?

Muito bem colocada a pergunta! Realmente vejo assim, como uma nova vida. Foi muito difícil, acredito que seja assim para todos, mas acho que de uma maneira ímpar, pois cada pessoa tem seu tempo, sua forma de percepção e reação à nova condição. É um campo novo a ser explorado e compreendido rapidamente, pois nada vai parar no mundo para te esperar… tudo segue o seu curso!

Na sua vida profissional, enfrentou muitas dificuldades?

Muitas, pois tive que mudar totalmente de área. Trabalhava com segurança privada e com eventos, um ramo em que a aparência é muito importante, ou seja, depois de uma reabilitação longa e muito conturbada, simplesmente não tinha para onde voltar, tive que me reinventar aí também!

Como foi a experiência de se reapresentar aos amigos e familiares como PcD?

Foi difícil, desagradável e de inesperadas reações das duas partes. A questão, é que tem um tempo de maturação nesse processo. Muitas pessoas se afastaram, outras se aproximaram e os significados de parentesco e amizade, ganham novas cores e nuances, é quando você percebe que entre o branco e o preto, há uma vasta variação de cinza!

Como você vê a questão dos táxis adaptados na cidade de São Paulo?

Se você parar em qualquer grande avenida de São Paulo e esperar para ver esse táxi “fantasma” adaptado, vai criar raízes no lugar onde parou. Esse é um serviço de vital importância para a cidade, que muito infelizmente é um “natimorto”. Foi mal planejado, mal aplicado, mal difundido e mal fiscalizado. Tem um custo muito alto, para a adaptação do táxi, sem nenhuma contrapartida de redução de impostos a quem faz o investimento. Não houve incentivo, não há de fato o serviço, só houve propaganda de vereadores espertos, que hoje são deputados e inaugurações de um prefeito incompetente!

Com a vinda das leis que se referem à acessibilidade, para você, quais são os pontos positivos e negativos nessa questão?

Sem entrar no mérito de uma ou outra dessas leis, acho que em geral o Brasil nesse e em outros temas, tem leis modernas e até avançadas. Acredito que o problema, é a não aplicação e fiscalização dessas leis. Se a lei só existir no papel, é uma questão jurídica e burocrática, a lei tem que ser posta em prática, tem que estar nas ruas e na sociedade, é uma questão de educação também. Vemos com frequência, carros oficiais que estacionam em vagas destinadas a pessoas com deficiência, é um absurdo é como chamar o bandido, para prender a polícia!

Você é uma pessoa muito criativa. Percebe-se isso na Rede Social Facebook, onde você costuma publicar fotomontagens repletas de humor e criatividade. Como levar uma vida bem humorada após tornar-se uma pessoa com deficiência? Qual é o segredo?

Acredito que o bom humor, seja um traço da minha personalidade, já era bem humorado antes de me tornar tetraplégico e logo percebi, que diante e depois de tudo que passei, o mau humor não me ajudaria em nada. É claro que tenho lá meus dias ruins, tenho contas para pagar como todo mundo e não sou o cara mais fácil do mundo, mas faço meu esforço para tentar melhorar e me manter bem, com a cabeça boa, é um exercício diário.

Deixe uma mensagem aos leitores do blog Deficiente Ciente.

Eu sempre fui uma pessoa muito independente, perder essa independência repentinamente, me jogou para baixo é natural, mas a vida é maior que tudo. Ninguém espera uma deficiência ou depende de uma tragédia, para ver as cores mais vivas, a que muitas pessoas que passam a ter uma deficiência dizem ver. Não estou dizendo que é fácil, não é, mas é possível se reinventar, continuar, mudar e viver a vida com dignidade e alegria. Vamos precisar mais dos outros, vamos ter que ter mais paciência, mas é possível… É possível amigos, não desistam!

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