Por MILENA CRESTANI
15/07/2012 19h30
15/07/2012 19h30
Por que as pessoas moravam antes no instituto?
A maioria das famílias do interior não tinha condições de trazer as crianças para atendimento em Campo Grande, mas, na década de 80, foi eliminando o internato.
Quais princípios são mantidos desde a fundação?
Florivaldo Vargas fundou a instituição com a filosofia de inclusão das pessoas com deficiência visual na educação, no desporto, na cultura, no lazer e no mercado de trabalho. Seguimos essa mesma filosofia, com fortalecimento do apoio à educação especializada e apoio pedagógico.
O que é oferecido hoje no Ismac?
Hoje vivemos um momento histórico, por meio de parceria com o Ministério da Saúde e das secretarias estadual e municipal de Saúde, pois passamos a ser reconhecidos como Centro de Reabilitação Visual. Contamos com setor de oftalmologia, avaliação funcional da visão, indicação de órtese e próteses oculares (oferecendo desde bengalas, lupas e óculos especiais para pessoas de baixa visão) e todos os atendimentos que compõem o programa de reabilitação. Há ainda o serviço social e de psicologia que orienta a pessoa e sua família, além de orientação para a vida diária, mobilidade e desenvolvimento da criança e do adolescente. Com a parceria teremos possibilidade de fortalecer esses programas e atender um público maior e com mais qualidade.
Quantas pessoas são atendidas?
No total atendemos 196 pessoas que frequentam o Instituto nos diversos programas e 580 cadastradas que vem temporariamente para receber orientações. Também desenvolvemos atendimento educacional especializado, com sala de recursos, ensino no sistema braile, biblioteca e sala de informática, que viabiliza recursos pedagógicos para que as pessoas estejam nas escolas e universidade com qualidade. Outro ponto é o desenvolvimento e a capacitação para o mercado de trabalho e o departamento de desporto, onde contamos com 27 atletas no ranking nacional e internacional, oferecendo atividades como golbol, futsal e judô. A atleta Michele Ferreira ganhou o bronze em Pequim (Olimpíadas) e está indo para a Olimpíada de Londres para tentar o ouro para o Brasil. Outro destaque são as atividades culturais, como dança, teatro e coral.
Tivemos alguns avanços nas políticas de inclusão no aspecto educacional e também na acessibilidade, mas qual continua sendo a maior dificuldade?
No dia 17 de novembro do ano passado, a presidente Dilma Rousseff lançou o programa “Viver sem Limites”, que cria condições financeiras aos estados e municípios para ações de acessibilidade, inclusão nas escolas, assistência social e desenvolvimento de tecnologias para auxiliar pessoas com deficiências. Esse programa trará uma grande evolução. A necessidade dessas ações ganhou força na convenção da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre direitos das pessoas com deficiências, a qual foi ratificada pelo Brasil e tem status de emenda constitucional, como uma lei. Ela preconiza que as pessoas sejam protagonistas da inclusão social e que poder público viabilize recursos para isso. Exige, por exemplo, que as cidades sejam acessíveis no transporte público e nas calçadas.
E o acesso aos deficientes visuais no ensino superior e no mercado de trabalho?
No Brasil temos diversos profissionais atuando em diversas áreas. São 25 milhões de pessoas com deficiência. Nós nos formamos, fazemos especializações, mas quando nos deparamos com o mercado de trabalho ainda há certa barreira, pois as pessoas, muitas vezes, observam a deficiência como limite. Primeiramente temos de observar a pessoa, o que é possível o profissional com deficiência desenvolver. Logicamente, não será possível fazer algumas atividades, mas a lei garante que o empregador precisa criar condições para que essa pessoa desenvolva o trabalho. Temos essa luta pela formação técnica e pela colocação no mercado de trabalho. Muitas empresas dão desculpa de que não há pessoa com formação, mas a questão é que a pessoa com formação não quer receber um salário menor apenas pela deficiência. Temos de observar o potencial e o currículo, não rotular se a pessoa é cega e assim imaginar que não dá conta desse trabalho.
Você enfrentou essa dificuldade quando não aceitaram que assumisse a vaga para qual foi aprovada em concurso?
Na verdade, enfrentar a discriminação foi muito mais difícil do que enfrentar a própria deficiência. É mais fácil superar a deficiência do que a discriminação. Você supera a deficiência, reabilita-se, tem sua formação, especialização, histórico de trabalho, faz concurso enquanto pessoa com deficiência, é aprovada, mas não é aceita. Todas as legislações falam que o empregador tem de dar condições para receber essa pessoa e respeitá-la. Isso foi uma situação horrível que eu vivi. O poder público deveria fazer a inclusão acontecer, mas foi o primeiro a discriminar. Não tive outra maneira de reivindicar a não ser entrando na Justiça e também pedindo danos morais. A partir do momento que me discriminaram entrei na Justiça porque a causa não é mais minha, mas das pessoas com deficiência de todo o Brasil. Quando vou a palestras ou eventos sou procurada para explicar sobre esse caso. Essa causa é do movimento e de cada pessoa com deficiência.
Entrevista publicada na edição deste domingo (15) do jornal CORREIO DO ESTADO
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