A decisão foi publicada no Diário Oficial da União em 1º de dezembro de 2025 e gerou forte repercussão entre parlamentares e entidades que atuam na defesa dos direitos das pessoas com deficiência.
O que dizia o projeto de lei
O PL 2.621/2023, aprovado pelo Congresso Nacional, alterava o Estatuto da Pessoa com Deficiência para incluir, entre as responsabilidades do SUS, a distribuição gratuita de cordões de fita com desenhos de girassóis.
A proposta tinha como objetivo facilitar a identificação, em espaços públicos, de pessoas com deficiências ocultas, ampliando a segurança, o acolhimento e a compreensão por parte de servidores, profissionais de saúde, seguranças, atendentes e da sociedade em geral.
Na prática, o texto buscava transformar em política pública nacional algo que já vem sendo utilizado em aeroportos, shoppings, metrôs e serviços diversos no Brasil e no mundo.
O que decidiu o governo
O presidente Lula optou pelo veto integral ao projeto. Segundo a mensagem encaminhada ao Congresso, o governo alegou que a proposta:
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criava despesa obrigatória e continuada para o SUS;
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não apresentava estimativa adequada de impacto orçamentário;
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não indicava fonte de custeio nem medidas de compensação.
Com isso, o Executivo argumentou que o texto violaria a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025.
Na justificativa, os pareceres dos Ministérios da Fazenda e da Saúde reforçam que, sem previsão orçamentária clara, a execução da medida seria incompatível com as regras fiscais em vigor.
O que é o cordão de girassol e por que ele é importante
O cordão de girassol nasceu no Reino Unido como parte do programa Hidden Disabilities Sunflower, criado para que pessoas com deficiências invisíveis pudessem sinalizar, de forma discreta, que podem precisar de mais tempo, compreensão ou apoio em determinadas situações. Wikipédia
Hoje, o símbolo é reconhecido em aeroportos, redes de transporte, serviços públicos e estabelecimentos privados em vários países. No Brasil, o governo federal já havia sancionado, em 2023, o uso do cordão de girassol como símbolo de identificação de pessoas com deficiências invisíveis, mas sem garantir sua distribuição gratuita em âmbito nacional — justamente o ponto que o PL 2.621/2023 buscava suprir. Wikipédia+1
Para muitas pessoas com deficiência e seus familiares, o cordão funciona como uma ponte de comunicação silenciosa: ele não substitui laudos, tratamentos ou políticas públicas, mas ajuda a evitar constrangimentos, mal-entendidos e situações de risco, especialmente em locais cheios ou estressantes.
Críticas e preocupações levantadas por ativistas e entidades
O veto reacendeu um debate sensível: como o Estado brasileiro deve priorizar recursos quando o assunto é inclusão de pessoas com deficiências ocultas?
Entre parlamentares e entidades ligadas ao tema, surgiram diferentes reações:
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Parlamentares defensores do projeto afirmam que o cordão, embora simples e de baixo custo, ainda é inacessível para muitas famílias, especialmente as de baixa renda. Para eles, o SUS garantir a distribuição seria um passo concreto de inclusão, alinhado ao Estatuto da Pessoa com Deficiência.
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Alguns representantes do movimento da deficiência criticam o veto por entenderem que o governo não estaria reconhecendo, com a devida prioridade, as demandas específicas das pessoas com deficiências não aparentes, que seguem enfrentando filas, constrangimentos e incompreensão cotidiana.
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Por outro lado, parte das entidades de autistas e outras organizações defendem o veto, argumentando que o foco dos recursos públicos deve estar em políticas mais estruturantes — como diagnóstico precoce, atendimento especializado, suporte na escola e no trabalho — e que o cordão, por si só, não resolveria os grandes gargalos de cuidado e inclusão.
Em resumo, mesmo dentro da comunidade de pessoas com deficiência e suas famílias, há perspectivas diferentes sobre qual deve ser a prioridade: a distribuição do cordão pelo SUS ou a destinação de recursos a outras ações de acessibilidade e apoio.
Debate sobre custo, prioridade e dignidade
A discussão sobre o cordão de girassol vai além do objeto em si. Ela toca em temas como:
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Custo x impacto: defensores do projeto argumentam que o valor por unidade é relativamente baixo diante do potencial de acolhimento e segurança que o cordão pode oferecer em situações de crise, desorientação ou sobrecarga sensorial.
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Visibilidade das deficiências ocultas: o veto é visto, por parte dos críticos, como um símbolo de que as deficiências invisíveis continuam menos reconhecidas e compreendidas, mesmo após avanços como o reconhecimento oficial do cordão como símbolo.
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Risco de estigmatização: alguns especialistas lembram que qualquer marca de identificação precisa vir acompanhada de campanhas de conscientização, para evitar que o cordão seja usado de forma discriminatória ou, ao contrário, ignorado por desconhecimento.
O que acontece agora?
Com o veto presidencial, o projeto retorna ao Congresso Nacional, que pode:
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manter o veto, encerrando a tramitação do PL 2.621/2023;
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ou derrubar o veto, fazendo com que a obrigação de distribuição do cordão pelo SUS passe a valer, mesmo contra a posição do Executivo.
Enquanto isso, o debate continua:
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movimentos de pessoas com deficiência cobram políticas que garantam mais visibilidade, acolhimento e segurança às pessoas com deficiências ocultas;
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governos e parlamentares são chamados a discutir modelos de financiamento que permitam conciliar responsabilidade fiscal com o cumprimento efetivo dos direitos previstos na legislação brasileira.
Para reflexão no campo da inclusão
Mais do que um acessório, o cordão de girassol se tornou um símbolo de luta por reconhecimento das deficiências que não aparecem à primeira vista, mas impactam profundamente a vida das pessoas.
O veto ao projeto que previa sua distribuição pelo SUS não encerra a discussão. Ao contrário, expõe a necessidade de:
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escutar, de forma qualificada, as diferentes vozes das pessoas com deficiência e suas famílias;
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construir soluções que unam responsabilidade orçamentária e compromisso real com a inclusão;
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ampliar campanhas de informação para que a sociedade compreenda o que são as deficiências ocultas e como apoiar, com respeito, quem convive com elas.
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