quarta-feira, 25 de abril de 2012

Pessoa Cega - Dia Internacional do Cão-Guia (Por Deborah Prates)


 Caro leitor, Abaixo texto da amiga Deborah Prates, que diz respeito ao seu cão-guia, “Jimmy Prates”.


Pessoa Cega - Dia Internacional do Cão-Guia


Dia de “JIMMY PRATES”!  Claro que dia disso ou daquilo tem somente a conotação de enfatizar/destacar fatos relevantes. Em minha vida , dia do cão-guia são os 365 de cada ano. Jimmy está comigo 24 horas!

Para sensibilizar e informar a coletividade/sociedade sobre as benesses do cão-guia é que vale a recapitulação do nosso fantástico encontro.

Ceguei num final de janeiro e as aulas da minha filhota recomeçariam em meados de fevereiro, pelo que a minha adaptação teve que ser IMEDIATA.

Tempo para choro e depressão? NÃO tive. Muito a fazer em tão pouco tempo! Reclamar/blasfemar, de nada adiantaria. Fui buscar aula de mobilidade/bengala no IBC, mas, como de se esperar em atividades governamentais, NÃO havia mais vaga no próximo curso. Daí foi que, às duras penas, consegui que um professor do próprio IBC, em suas horas de folga, viesse a minha casa para ministrar aulas. Não foram mais do que seis, já que as condições financeiras também não permitiram além.

Senti muito a perda do espaço aéreo! Daí foi que não me dei bem com a bengala. Era tão cega quanto eu! Começava num lado e, quando percebia, já estava do outro. Passei a andar como peixe, na diagonal da vida! Berê não se deu com a minha personalidade.

Decidi por um olho quadrúpede. Fui à luta! Na época o Integra não teria condições de atender a demanda e não perdi tempo. Procurei uma pessoa usuária de cão-guia para algumas dicas, contudo, não consegui muita coisa, já que era extremamente ocupada e não pôde me dar atenção.

Minha filhota, pela Internet, conseguiu os dados da fundação de onde trouxe Jimmy Prates. Uma amiga e professora de inglês também é coresponsável por essa conquista. Sou adepta da física quântica, pelo que soube querer Jimmy. Na decolagem tive a certeza de que, no voo de volta, traria a totalidade da busca.

Jimmy Prates é um labrador amarelo claro, macho e está com seis anos. Tem o tempo da minha cegueira! Nasceu para mim! Fui para América sem falar um bom inglês.

O universo conspirava a meu favor. O pessoal da fundação “novaiorquina” andava comigo com dicionários de espanhol, português/ Portugal e sempre sorrindo!

Obstáculos, empecilhos? Nenhum! A energia POSITIVA era total. Deu tudo certo e sou extremamente AGRADECIDA- POR TODA A ETERNIDADE – ao Povo americano. Os USA me deram o que o meu País não teve para seu cidadão! A recepção fora maravilhosa. Só tenho elogios e gratidão aos americanos.

A vida prossegue num ritmo acelerado, já que o tempo é implacável. É questão de sobrevivência andarmos no compasso das horas!

Digo que NÃO foi difícil conseguir Jimmy Prates. A perseverança é uma das minhas características. Foi minucioso o procedimento burocrático exigido. Só foi respirar fundo e cumprir metas. Jimmy no Brasil é a resposta para quem tenha alguma dúvida quanto a expressão: “QUERER É PODER”. Claro é que necessitamos SABER querer!

Pós Jimmy a qualidade de vida da Família melhorou sensivelmente. O curso de treinamento na América foi hiper maravilhoso e deu-me a segurança suficiente para evoluir e dominar as situações. Somos uma dupla do barulho!

A dupla continua em formação. Isso porque cada dia é diferente do outro, valendo afirmar que as circunstâncias se apresentam inusitadamente.

O BOM SENSO há que prevalecer sempre! A aplicação correta da razão para julgar ou raciocinar em cada caso particular da vida é o “X” do sucesso. Desesperar jamais!

Tenho algumas boas histórias com Jimmy, que, noutra oportunidade, contarei. Bem legais! Amo Jimmy Prates prá valer, de montão e à beça! Juntos damos boas gargalhadas! Exercito os músculos da face, o que retarda o envelhecimento, além de melhorar a forma do coração! Dou a maior força aos interessados. Agora, como tudo na vida, hão que ser analisados, caso a caso, se o guia seria a melhor solução.

A opção há que ser SUSTENTÁVEL e RESPONSÁVEL. Gostar de cachorro é pouco para buscar um guia. É mister AMAR cão para essa iniciativa! Cuida-se de um ser vivo que, como nós, está sujeito a chuvas e trovoadas. Num dia estamos melhor, com a corda toda! Noutro, já não estamos tão simpáticos. Um cão precisa de cuidados permanentes. Uma bengala, ao entrarmos em casa, só precisa ser pendurada atrás da porta! Jimmy, em todas as entradas, já para na área de serviço para uma boa limpeza. A bengala não precisa de ir ao veterinário nem de vacinas. O guia precisa de atenção constante. Então, se não se tem paciência com muito amor essa seria a opção mais irresponsável possível na vida de um cego.

Esse é um bom espaço para eu dar notícia aos amigos que, ao contrário do que muitos imaginam, o guia não sofre maus tratos pelo fato de ser um CÃO TRABALHADOR. Bem longe desse pensamento! Jimmy, por exemplo, tem a vida dele independente da minha no tempo em que é um cachorro. Como assim? Jimmy tem o seu tempo para correr atrás de sua bolinha amada, de modo que se exercita diariamente SEM ser guia. Além do que faz natação numa piscina de treinamento para cães da Polícia Militar no RJ e, em casa, tem a vida de um cão “pet”. Sua alimentação é hiper saudável, sua pelagem divinamente bem cuidada, etc.. E para completar a sua vidinha – mais ou menos maravilhosa – ainda tem a vida social/de trabalho, indo a todos os cantos do Planeta, como muitos de nós não pode desfrutar. Isso é que é VIDA DE CÃO! O resto é conversa!

Quais as vantagens de me locomover com o cão ao invés de usar a bengala? Muitas! Sem comparação. Como disse acima, a bengala é tão cega quanto eu! Indubitavelmente um olho quadrúpede é bem melhor. Além da facilidade com a locomoção, já que confiamos um no outro, Jimmy é, na maioria das vezes, um ponto de convergência entre o cego e a coletividade. Por ilustração, no Metrô é sempre uma FESTA! Quando saímos os que ficam estão no maior bate-papo, e nós nos despedimos rindo e dando cartões. A cada dia novas amizades e inteiração com as pessoas.

Diariamente e com o maior carinho, chego junto a coletividade para noticiar como chegar ao cão-guia quando ele estiver na condução de seu usuário. São observações de puro tino. Comparo o guia com a vida de um motorista. Não devemos distrair o motorista quando estiver na direção do veículo por enfoque óbvio. Mas, como os hábitos dos seres humanos estão comprometidos desde muito, é que continuamos a ver transgressões no trânsito como, por ilustração, motoristas que falam no celular, comem quando estão dirigindo e o fazem – comumente – embriagados, de sorte a comprometer a vida de seus semelhantes. Nesse diapasão é que também percebo pessoas a ofertarem comida ao Jimmy, bem como insistem em chamá-lo enquanto caminhamos em total desrespeito ao cego. Por que desrespeito? ora, assim como ocorre com os motoristas, uma distração do guia pode acarretar um ACIDENTE ao usuário, como cair num buraco, bater com o rosto num obstáculo qualquer, etc.. Viram como não é difícil saber como se comportar diante de uma dupla de cego e cão-guia?! Basta ter uma generosa dose de PERSPICÁCIA e tudo resolvido!

Se o leitor é um “cachorrento contumaz” e não consegue passar por um guia sem falar-lhe, é só pedir para que o cego pare para uma ligeira apresentação. Em regra os usuários são bem receptivos e até gostam de interatuar com a coletividade. Particularmente amo quando me perguntam sobre Jimmy!

Percebo que o mundo não está de todo perdido. Falta mesmo é a ACESSIBILIDADE ATITUDINAL como carro chefe! Precisamos mudar hábitos arraigados ao longo da civilização. Processo lento, pelo que imperativo se faz a insistência. Só depende de nós a conquista de um Planeta com maior bem-estar para todos! O grande lance é arregaçarmos às mangas e partirmos para a luta! Precisamos de mais responsabilidade nas urnas nos outubros eleitorais!

Temos que aprender a cobrar/exigir nossos DIREITOS!

Brasileiros gostam muito de discutir a vida nas filas. Ah! O próximo da frente e de trás são os muros das lamentações. Nas mesas dos bares a situação se repete. Dizemos: GARÇOM MAIS UM CHOPE! E vamos desfiando os problemas e as soluções. Depois de jogar muita conversa fora vem a frase final: GARÇOM, A SAIDEIRA E A CONTA! E vamos para as nossas casas distribuindo culpas a granel pelas tempestades a que somos sujeitos no dia-a-dia!

Julgo que somos os CULPADOS por tudo – CULTURALMENTE FALANDO – de MAL que nos acontece. Por isso é que repito que mudar hábitos é processo lento.

A mídia, em muito, tem nos ajudado na questão de levar a sociedade as informações sobre o cão-guia. Porém, tal iniciativa, sem dúvida, deveria ser dos Governos! Mas, fica a pergunta: INTERESSAM E/OU QUEREM OS GOVERNANTES EDUCAR/INFORMAR A COLETIVIDADE? E NÓS, VAMOS NOS CALAR ETERNAMENTE?
Numa situação já fui cruelmente DISCRIMINADA pela maior autoridade do Poder Judiciário do RJ, quando tentei entrar no foro central – local já frequentado fazia dois anos – com Jimmy Prates. O então desembargador presidente ordenou que os seguranças separasse a dupla! Até hoje tramita uma ação em que sou autora em face do Estado do RJ. Inacreditável, né? Pois é, coisas do SER HUMANO que se entende mais IGUAL do que os demais! Acima da lei e por aí afora para todo tipo de mau gosto! E a rotina continua.

No contraponto se faz imperativo respeitarmos os IGUAIS que detestam cachorros. É um direito! Contudo, para esses é que deixo uma singela sugestão: ULTRAPASSE A FIGURA DO GUIA PARA ATINGIR NO SER HUMANO A QUEM ELE TANTO AJUDA. Somos um só! Jimmy é meu olho e eu o seu cérebro. Seja solidário! O guia não incomoda. Foi treinado para não transtornar quem quer que seja!

Em mais essa data de conscientização dos direitos da pessoa com deficiência é que deixo aos amigos leitores um pensamento de Ghandi:

“A grandeza de uma nação e o seu progresso moral, podem ser avaliados pela forma como tratam os seus animais”.


Carinhosamente.
DEBORAH PRATES (cachogente)
+ JIMMY PRATES (pessocão)

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